Carta a um amigo
Boa noite, meu amigo
Da janela do meu quarto o sol se esconde. É o poente, onde pelos céus o vinho de Deus se espalha, dançando sob os espaços celestiais, embriagado de luz. Tudo começa a quedar-se no silencio. Os pássaros retornam aos ninhos, em ritual de amor à vida. Para um novo dia, cheio de cânticos e vôos na imensidão. Assim também minha alma, meu bom amigo, anseia pelos cânticos do caminhar, pelo perfume que se esparge pelos bosques quando as fadas e os duendes desatam os nós entre o espírito e a matéria para o voo necessário.
Um dia, aqui entre nós, estiveste. Sob esse mesmo teto de estrelas e sob este mesmo sol. Não pude te conhecer. Não pude te abraçar. O tempo de minha consciência seria retardado por quase dois mil anos. Mas aqui, latente dentro de mim, tua presença é maior do que toda esta natureza que me cerca, embora eu veja em cada mínima folha que cai, uma letra tua escrita no chão da minha existência. É uma carta que me escreves. E muitas vezes minhas lágrimas tem borrado as tuas letras. Depois, elas se transformam em enigmas, estranhos sinais que vou tentando decifrar aqui e ali, para não me enganar de estrada, para não ir para um lugar desconhecido, onde perder-me-ia para sempre de ti.
Meu amigo Mestre, desde menina eu te conheci horizonte, verdade, esperança. Não sei chamar-te além do meu amor. É a única palavra que tenho para ofertar-te neste dia do amigo. Por favor, ouve-a, como ouviste o centurião um dia. "Não sou digno que entreis em minha morada, mas dizei uma só palavra"... e poderei novamente, confiar no sorriso.
No trajeto dos teus passos azuis,
a noite se bordou de estrelas
e sob elas, a rosa da alma desabrocha,
apesar dos espinhos,
dos ventos da noite,
da solidão da voz.
Por certo, por diferentes caminhos,
todos um dia a Ti iremos.
Sós.
Lúcia Constantino
Enviado por Lúcia Constantino em 20/07/2014
Alterado em 20/07/2014