SEM ABRIGO PARA O OLHAR
Sobre a cômoda
aquele retrato.
Há quanto tempo olhando o vazio?
O vazio do olhar que se aninha
no vazio dos olhos do retrato.
O nicho primeiro do último pôr de sol,
do único pôr de sol
que era pleno de luz.
O que foi feito daquele passo de montanha
que deu à luz a esse olhar hoje opaco?
A nítida sensação de que o tempo passou
e encolheu todas as lembranças,
e vazou o retrato
para emoldurar a saudade.
É tão nítido isto:
a casca sobre a pedra,
o sal comendo a terra.
A pedra que quer ser livre
e apenas tem o peso da ousadia.
Como se o pó dominasse
os olhos, as lembranças,
e o sonho do que um dia foi luz
e hoje não cabe mais
na moldura eterna
que vaza ao olhar
todos os retratos.
(Direitos autorais reservados).
Lúcia Constantino
Enviado por Lúcia Constantino em 22/05/2013
Alterado em 29/09/2013
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